sexta-feira, 5 de julho de 2019

Contrato de estágio


Para que se interessa por estas questões, um excelente artigo de João Zenha Martins, «Estágios, formação profissional e trabalho: contratos e retratos», na Revista Eletrónica de Direito, Junho de 2019: 

«Os estágios parecem ser utilizados muitas vezes em alternativa ao emprego regular, aproveitando as reconhecidas dificuldades de ingresso dos jovens e desempregados de longa duração no mercado de trabalho.

Além da eventual comparticipação financeira assegurada por fundos públicos, o recurso preferencial aos contratos de estágios justifica-se, em análise económico-financeira que incorpora o dispêndio agregado aos contratos a termo, com base na ausência de custos fixos relacionados com férias, subsídios de Natal e de férias e outro tanto com a ausência de qualquer compensação associada à caducidade do contrato.

Os regimes dos estágios extracurriculares e profissionais irrelevam a natureza das necessidades empresariais a satisfazer com o contrato de estágio e são materialmente descoincidentes. 

Compreende-se mal as diferenças de forma subjacentes (Decreto-Lei e Portaria) — em área que, pela sua relevante cobertura estatística e diante dos direitos e interesses implicados, suscitaria outra dignidade formal —, e, em qualquer dos diplomas, vislumbram-se contradições e lacunas, havendo folga para uma revisão cuidada destes regimes, que quadre melhor com o sentido e o alcance da Lei n.º 55/2017, de 17.07.

A situação, na estrita perspetiva política, tem virtualidades, uma vez que, no plano estatístico, a execução de um contrato de estágio afasta formalmente o estagiário de uma situação técnica de desemprego e, na sequência da extinção do contrato de estágio, agora na ótica do dispêndio financeiro, não há por princípio prazo bastante para aceder à cobertura do sistema previdencial relacionada com a proteção no desemprego, gerando-se, por essa via, uma poupança de recursos públicos.

A adoção de políticas ativas de emprego que visam aprofundar os mecanismos para promover a empregabilidade dos jovens e desempregados de longa duração implica, contudo, que, com referência aos recursos públicos mobilizáveis, se deva privilegiar a contratação laboral qua tale e não os contratos de estágio.

Torna-se, por isso, necessário criar incentivos eficientes, como subsídios de emprego ou contribuições de seguros para jovens e desempregados de longa duração que garantam condições de trabalho e de vida decentes, encorajando, também por esta via, os empregadores a investir tanto na criação de empregos de qualidade para jovens e desempregados de longa duração quanto na formação contínua e atualização das suas competências durante o emprego.

Verificado o decesso do contrato de aprendizagem e sendo inequívoco o realce genericamente emprestado pelas políticas do mercado de trabalho à empregabilidade, tal significará, em síntese, uma recondução do contrato de estágio à sua verdadeira razão de ser — aquisição de competências práticas em contexto de trabalho —, e, em época em que “a questão do trabalho está prestes a emergir da última obsessão pelo emprego”, o consequente abandono da sua utilização esdrúxula como fórmula atípica de contratação laboral.»

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